A Ureia na Nutrição Bovina: Guia Completo para Pecuaristas

NUTRIÇÃO

Veterinário Edson Martins

Quando o assunto é nutrição de bovinos, a ureia aparece como um dos componentes mais versáteis e economicamente viáveis para o pecuarista brasileiro. Este composto nitrogenado tem revolucionado a forma como alimentamos o gado em nosso país, principalmente em períodos críticos como a seca, quando as pastagens perdem qualidade nutricional.

A Ureia na Nutrição Bovina: Guia Completo para Pecuaristas

É fato que poucos insumos oferecem tantos benefícios econômicos quanto a ureia na nutrição de bovinos. Este poderoso composto nitrogenado, quando utilizado corretamente, pode reduzir drasticamente os custos com suplementação proteica enquanto mantém ou até melhora o desempenho do rebanho.

No entanto, o que muitos amigos pecuaristas desconhecem são as diferentes versões disponíveis no mercado - desde a convencional até as inovadoras ureias protegidas - e as técnicas seguras de administração que evitam riscos potencialmente fatais ao gado.

Neste guia completo, vamos explicar sem enrolação como funciona no organismo bovino, as dosagens ideais para cada categoria animal, estratégias de adaptação do rebanho e as mais recentes pesquisas científicas que estão revolucionando seu uso nas fazendas brasileiras. Prepare-se para transformar sua visão sobre este aliado indispensável do agronegócio nacional.

Afinal, o que é a ureia e como funciona na nutrição bovina?

A ureia é um composto orgânico rico em nitrogênio (aproximadamente 45%) que, quando administrado corretamente na alimentação dos bovinos, é convertido em proteína microbiana no rúmen. Isso acontece porque os microrganismos ruminais conseguem utilizar o nitrogênio não-proteico (NNP) da ureia para seu próprio desenvolvimento.

Quando um bovino consome ureia, ela é rapidamente hidrolisada em amônia no rúmen. Esta amônia, associada a uma fonte de carboidratos (energia), permite que as bactérias ruminais sintetizem proteínas para seu crescimento, que posteriormente serão digeridas e aproveitadas pelo animal.

"A ureia não é uma proteína em si, mas uma fonte de nitrogênio que os microrganismos do rúmen podem transformar em proteína" - explica a Drª Ana Cláudia Ruggieri, pesquisadora da Embrapa Pecuária Sudeste.

Os diferentes tipos de ureia disponíveis para pecuária

O mercado brasileiro oferece hoje diversas opções de ureia para uso na nutrição animal. Conhecer cada uma delas é fundamental para fazer a escolha mais acertada para seu sistema de produção.

1. Ureia Agrícola Convencional

A mais comum e geralmente mais barata, contém cerca de 45% de nitrogênio. É utilizada tanto na agricultura quanto na pecuária, sendo completamente solúvel em água. Por ser rapidamente liberada no rúmen, exige cuidados especiais na adaptação do gado.

2. Ureia Pecuária

Similar à ureia agrícola, mas com grau de pureza e controle de qualidade específicos para uso animal. Geralmente contém um corante azul para facilitar sua identificação e evitar confusões com outros suplementos.

3. Ureia Protegida (ou de Liberação Lenta)

Inovação importante para o agronegócio, apresenta liberação gradual do nitrogênio no rúmen, reduzindo riscos de intoxicação e aumentando o aproveitamento do nutriente. Produtos como a Optigen® e a Rumensina® são exemplos desta categoria.

Um estudo realizado pela Universidade Federal de Viçosa (2022) demonstrou que bovinos de corte alimentados com ureia protegida apresentaram ganho de peso 12% superior comparado aos que receberam ureia convencional, com a mesma quantidade de nitrogênio na dieta.

4. Amiréia

Combinação de ureia com amido gelatinizado através de processo de extrusão. Esta mistura proporciona liberação mais lenta do nitrogênio, maior palatabilidade e menor risco de intoxicação.

5. Ureia + Enxofre

Conhecida como "ureia enxofrada", contém enxofre em sua composição para melhorar a eficiência da síntese de proteína microbiana, já que o enxofre é essencial para a formação de aminoácidos sulfurados.

Os riscos da utilização incorreta da ureia

A inclusão de ureia na dieta dos bovinos traz benefícios econômicos e nutricionais, mas exige conhecimento técnico e manejo adequado. O principal risco relacionado ao uso incorreto é a intoxicação, que pode ser fatal.

Sintomas de intoxicação por ureia:

  • Tremores musculares

  • Respiração ofegante

  • Salivação excessiva

  • Incoordenação motora

  • Timpanismo (inchaço do rúmen)

  • Em casos severos, prostração e morte rápida

"Em uma investigação recente que conduzimos em uma propriedade do Mato Grosso, 12 animais morreram em menos de uma hora após consumo acidental de uma mistura mineral com excesso de ureia. A rapidez do quadro clínico evidencia a importância do manejo correto", relata o Dr. Paulo Menezes, médico veterinário especialista em nutrição de ruminantes.

Como utilizar ureia na alimentação do gado com segurança

Para garantir o sucesso no uso da ureia e evitar problemas, o pecuarista precisa seguir algumas recomendações fundamentais:

1. Adaptação gradual do rebanho

A microbiota ruminal precisa de tempo para se adaptar ao uso da ureia. Recomenda-se iniciar com doses baixas (0,1% da matéria seca da dieta) e aumentar gradualmente ao longo de 14 a 21 dias.

2. Fornecimento de fontes de energia

A ureia só será adequadamente aproveitada se houver disponibilidade de carboidratos (energia) suficientes. Forneça alimentos como milho moído, sorgo, melaço ou cana-de-açúcar junto com a ureia.

3. Mistura homogênea

A ureia deve estar perfeitamente distribuída na mistura mineral ou na ração para evitar consumo concentrado. Utilize misturadores adequados ou contrate serviços especializados.

4. Cálculo correto das dosagens

As recomendações gerais para bovinos adultos são:

  • Ureia convencional: máximo de 1% da matéria seca total da dieta

  • Ureia protegida: até 2% da matéria seca total da dieta

  • Vacas em lactação: máximo de 180g/animal/dia

  • Bovinos de corte: máximo de 150g/animal/dia

5. Uso de cochos adequados

Utilize cochos cobertos para evitar dissolução pela chuva, que pode levar à concentração irregular da ureia. Preferencialmente, cochos com proteção contra o vento também são indicados.

Estratégias eficientes de uso da ureia na pecuária moderna

Pesquisa recente da Universidade de São Paulo (USP) mostrou que pecuaristas que utilizam ureia estrategicamente conseguem reduzir em até 30% os custos com suplementação proteica, sem prejuízo ao desempenho animal.

Na época seca

Durante a estação seca, quando as pastagens estão com baixo teor proteico, a suplementação com ureia torna-se especialmente importante:

  1. Mistura mineral com ureia: adicionar 30% de ureia ao sal mineral comum é uma estratégia eficaz para manutenção de peso em períodos críticos.

  2. Proteinados com ureia: suplementos multi-ingredientes contendo ureia, minerais, fontes de energia e proteína verdadeira ajudam a manter a produtividade do rebanho.

  3. Ureia na silagem: a adição de 0,5% de ureia na silagem de milho ou sorgo eleva o teor proteico e melhora a digestibilidade.

Na época das águas

Mesmo no período chuvoso, quando as pastagens estão mais nutritivas, a ureia pode ser utilizada:

  1. Suplementação estratégica: níveis mais baixos de ureia (15-20% da proteína total) em suplementos de baixo consumo ajudam a equilibrar a relação energia

    ína da dieta.

  2. Confinamento: em dietas de terminação, a ureia pode substituir parcialmente fontes proteicas mais caras, como o farelo de soja.

Novidades tecnológicas no uso da ureia na nutrição bovina

O agronegócio brasileiro tem investido em pesquisas para aprimorar o uso da ureia na pecuária. Entre as inovações recentes, destacam-se:

Ureia encapsulada com polímeros biodegradáveis

Pesquisadores da Embrapa desenvolveram uma tecnologia que recobre os grânulos de ureia com polímeros biodegradáveis, garantindo liberação ainda mais controlada e menor impacto ambiental.

"Esta nova geração de ureias protegidas representa um avanço significativo, pois além de melhorar o aproveitamento pelo animal, reduz a emissão de gases de efeito estufa associados à fermentação ruminal", destaca o pesquisador Roberto Giolo, da Embrapa Gado de Corte.

Complexos ureia-mineral

Combinando ureia com minerais específicos, estas formulações melhoram tanto o aproveitamento do nitrogênio quanto a absorção dos minerais essenciais, resultando em melhor desempenho animal.

Um estudo conduzido pela Universidade Federal de Minas Gerais (2023) demonstrou que novilhos Nelore recebendo complexo ureia-zinco apresentaram melhor conversão alimentar e maior ganho médio diário comparado aos que receberam os mesmos nutrientes separadamente.

A ureia como aliada do pecuarista

A utilização correta da ureia na alimentação dos bovinos representa uma oportunidade para o pecuarista aumentar a eficiência produtiva com menor custo. Em um cenário onde as margens de lucro são cada vez mais apertadas, este insumo pode fazer diferença significativa no resultado final da atividade.

Para garantir o sucesso, lembre-se:

  • Escolha o tipo de ureia mais adequado para seu sistema de produção

  • Respeite o período de adaptação dos animais

  • Forneça fonte de energia adequada junto com a ureia

  • Calcule corretamente as dosagens

  • Monitore o rebanho, especialmente nas primeiras semanas de uso

Busque sempre orientação técnica de um zootecnista ou médico veterinário especializado em nutrição animal. Estes profissionais podem desenvolver protocolos específicos para sua propriedade, considerando fatores como categoria animal, objetivo produtivo e recursos disponíveis.

A ureia, quando bem utilizada, não é apenas um insumo - é uma ferramenta estratégica para a sustentabilidade econômica da pecuária brasileira.

Você já utiliza ureia na alimentação do seu rebanho? Compartilhe sua experiência conosco no fomulário abaixo e consulte nosso time de especialistas para receber orientações personalizadas para sua propriedade.


white and gray cattle on green field