Alta da Selic: O Impacto do Juros Alto Para o Pecuarista
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A recente alta da Selic para 14,25% impacta diretamente o pecuarista, elevando os custos de financiamento, insumos e operações na cadeia da carne bovina. Com juros mais altos, o crédito rural encarece, afetando investimentos e competitividade. O setor precisa de uma política econômica equilibrada que controle a inflação sem prejudicar a pecuária, fundamental para a economia brasileira.


Alta da Selic: Como a Política de Juros Impacta o Pecuarista e Toda a Cadeia da Carne Bovina
A recente elevação da taxa Selic para 14,25% pelo Comitê de Política Monetária (Copom) do Banco Central representa mais um duro golpe para o agronegócio brasileiro, especialmente para o setor da pecuária. Este é o maior patamar desde outubro de 2016 e marca o quinto aumento consecutivo da taxa básica de juros, evidenciando uma política econômica deficiente e irresponsável que tem gerado preocupação entre produtores rurais e especialistas do setor.
O que significa a alta da Selic para o pecuarista brasileiro?
A decisão do Banco Central de elevar a Selic em 1 ponto percentual não é apenas um número abstrato para quem trabalha no campo. Para o pecuarista, principalmente o pequeno e médio produtor, essa alta representa um aumento significativo no custo do crédito em um momento crítico: o período de pré-safra e planejamento de investimentos.
Rodrigo Xavier, economista e CEO da Oz Câmbio, explica que "para proteína animal, o impacto se dá em duas frentes: custo dos grãos (milho e soja) usados como ração pode subir, pressionando as margens dos produtores". Além disso, os financiamentos para manejo, confinamento e renovação de equipamentos ficam consideravelmente mais caros, afetando diretamente a capacidade de modernização das fazendas.
Efeitos em cascata: do campo ao prato do consumidor
A alta dos juros desencadeia uma reação em cadeia que afeta toda a produção de carne bovina no Brasil:
No início da cadeia, o pecuarista enfrenta custos mais altos para manter seu rebanho, desde a alimentação até os investimentos em genética e infraestrutura
Na fase de processamento, os frigoríficos que dependem de capital de giro para operar enfrentam juros mais altos em seus empréstimos
Na distribuição, o custo do transporte também sobe, impactado pelo encarecimento do crédito
No varejo, esses aumentos acabam sendo, em parte, repassados ao consumidor final
"Com o produtor mais cauteloso, a tendência é de negociações mais tardias de compra e venda, o que gera incerteza no planejamento e compromete a previsibilidade dos mercados", alerta Xavier. Isso pode resultar em flutuações mais acentuadas nos preços da carne bovina ao longo do ano.
A política econômica atual e seus impactos no agronegócio
A estratégia do atual governo de combater a inflação primordialmente via aumento de juros tem se mostrado prejudicial ao setor produtivo. Historicamente, esse tipo de abordagem penaliza setores intensivos em capital, como é o caso da pecuária. Durante o Plano Real, por exemplo, o setor agropecuário sofreu impactos similares que comprometeram sua competitividade.
Walter Belik, Professor Titular de Economia Agrícola do Instituto de Economia da Unicamp e um dos fundadores do Instituto Fome Zero, observa que "com a taxa de juros mais elevada no Brasil, vai atrair capital. O câmbio se valoriza, o real se valoriza em relação ao dólar, ou seja, as exportações vão ser remuneradas com valores menores do que anteriormente".
Essa valorização do real frente ao dólar pode desencorajar as exportações de carne bovina, um setor em que o Brasil é líder mundial. Em 2023, o país bateu recordes de exportação, mas essa posição pode ser comprometida com a persistência de uma política monetária restritiva.
O dilema do dólar para o pecuarista
O pecuarista brasileiro enfrenta um dilema complexo quando se trata do câmbio. Por um lado, um dólar mais fraco (consequência da alta da Selic) reduz a competitividade das exportações de carne bovina. Por outro, pode aliviar os custos de importação de alguns insumos essenciais.
"Dólar alto é bom para quem exporta, ruim para comprar insumos. Dólar baixo gera alívio nos custos, mas piora na receita externa. O ideal seria um câmbio equilibrado", sintetiza Rodrigo Xavier.
Essa instabilidade cambial dificulta o planejamento de longo prazo para o pecuarista, que precisa tomar decisões sobre retenção ou venda de animais, investimentos em pastagens e decisões de confinamento com meses ou anos de antecedência.
Impactos nos diferentes segmentos da pecuária
Nem todos os segmentos da pecuária são afetados da mesma forma pela alta dos juros. Segundo especialistas, as cadeias mais vulneráveis são:
Frango e ovos: por dependerem fortemente de ração à base de milho e soja, qualquer oscilação no preço desses grãos afeta diretamente os custos
Carne suína: por questões sanitárias e alta sensibilidade ao mercado externo
Carne bovina: apesar de ter demanda sólida, pode sofrer com barreiras comerciais ou flutuação cambial
A pecuária de corte, especialmente em sistemas de confinamento que exigem alto investimento inicial, tende a ser mais sensível às variações da Selic do que sistemas extensivos de criação a pasto.
Estratégias do pecuarista para enfrentar o cenário adverso
Diante desse cenário desafiador, os pecuaristas precisam adotar estratégias para mitigar os impactos da alta dos juros:
Diversificar mercados de exportação para diluir riscos geopolíticos
Investir em eficiência produtiva através de tecnologia, genética e nutrição
Ajustar a produção conforme os sinais de mercado
Aproveitar períodos de dólar alto para travar contratos futuros de exportação
Buscar alternativas de financiamento menos dependentes das flutuações da Selic
"É importante que o pecuarista esteja atento às alternativas de financiamento e à gestão eficiente dos recursos disponíveis", recomenda Sérgio Vale, economista-chefe da MB Associados.
O Plano Safra e o encarecimento do crédito rural
Com a Selic em 14,25%, o próximo Plano Safra deverá contemplar taxas de juros significativamente mais altas para o financiamento da produção agropecuária. "O Plano Safra terá taxas mais elevadas, e o produtor rural precisará lidar com um cenário de encarecimento do financiamento. Isso pode afetar os investimentos no setor", alerta Vale.
Essa realidade contrasta com outros países concorrentes do Brasil no mercado global de carnes, que muitas vezes contam com subsídios mais generosos e taxas de juros mais baixas para o financiamento da produção.
Perspectivas futuras: o que esperar para a pecuária brasileira
As projeções dos economistas apontam para uma desaceleração da economia brasileira em 2025 e possivelmente em 2026, como consequência do atual ciclo de alta dos juros. Essa desaceleração tende a afetar o consumo interno de carne bovina, pressionando ainda mais o setor.
O pecuarista precisará estar preparado para enfrentar não apenas os custos mais altos de produção, mas também uma possível retração da demanda. A busca por eficiência e produtividade torna-se ainda mais crucial nesse contexto.
A necessidade de uma política econômica mais equilibrada
A história mostra que políticas de juros excessivamente altos comprometem a competitividade do agronegócio brasileiro, especialmente da pecuária. Uma abordagem mais equilibrada, que combine o controle da inflação com estímulos à produção, seria mais benéfica para o setor e a todo o país. Infelizmente o governo federal não tem essa preocupação e não podemos contar com sua boa vontade.
E toda a nação tem sorte por ter pecuaristas que têm demonstrado notável resiliência diante dos desafios econômicos ao longo das décadas. No entanto, a persistência de uma política monetária restritiva pode comprometer não apenas a saúde financeira dos produtores, mas também a posição de liderança do Brasil no mercado global de carnes.
É fundamental que os formuladores de políticas econômicas reconheçam a importância estratégica da pecuária para a economia brasileira e busquem soluções que permitam o controle da inflação sem sacrificar excessivamente um setor que tanto contribui para a geração de empregos e divisas para o país.